Meu sorriso desdentado incomoda a mulher sentada ao lado no ônibus.
Eu sei que ela olhou de soslaio a sujeira entre minhas unhas amareladas e que
ela se encolhe no espaço que julga ser pouco do banco. A verdade mesmo é que não
me importo nenhum pouco com o asco dela nem de outros, tampouco me importo com
minha imundice. Não vou tirar minha barba por fazer há anos. Não vou apagar
Marieta de minha memória, nem suas pernas salientes entre os panos brancos do
vestido. Do nosso amor bruto só sobrou a poeira sertaneja fincada em minha
pele. Se a doçura da juventude foi se escondendo pelos anos que passei debaixo
do sol, uma coisa é certa: se está escondida, é porque ainda existe. Minha
sujeira que tanto enoja traz rastros de um passado que me foi belo. Não, eu não
vou raspar os cabelos que me restam! Vou carregar sempre essa trouxa com meus
trapos e minha garrafa de café já frio, sempre essas memórias tão vivas daquilo
por que sorri de verdade um dia, e Marieta, minha doce Marieta, levarei também.
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